O professor sempre está errado

https://www.soescola.com/2017/04/ninguem-leva-
mais-trabalho-pra-casa-que-o-professor.html

Percebemos que atualmente encontramos muitas coisas erradas no lado de dentro dos muros escolares.

A sociedade, como pagadora de impostos, tem o direito de expor estes fatos que comprometem a qualidade da educação.

Salienta-se que professores também pagam impostos, também fazem parte da sociedade e sofrem com atitudes que nada agregam na melhoria daquilo que é coletivo.

Vivemos um momento cujo discurso da moda é propalar aos quatro ventos que pagar impostos nos dá o direito de reclamar de tudo que é público. Afinal, reclamar é mais fácil do que fazermos a nossa parte para melhorar o atual estado das coisas. Que sociedade queremos? Como contribuímos para atingi-la? Reclamando?

Realmente, há muita coisa errada nas escolas. Não compartilho
da opinião de que reclamar resolve, muito menos acredito que publicar em redes sociais, abrindo margem para comentários superficiais que objetivam apenas aviltar pessoas ou entidades resolva. Mas já que a moda é reclamar, vamos reclamar de algumas coisas erradas...

É errado, por exemplo, um professor receber um salário muito aquém de sua responsabilidade. Este profissional, mesmo sendo humano, não pode errar, afinal, ele precisa ensinar tudo aquilo que é visto como socialmente necessário. Precisa ser perito em Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Ciências, etc. Precisa expor o conhecimento de modo que cada aluno, com suas diferenças, não só compreenda, mas crie paixão pela disciplina. E mais que isso: precisa ser perito em cuidar, em proteger, em dar carinho e atenção aos seus alunos.

Pensempos na responsabilidade dede  professor que passa 4 ou 8 horas de seu dia com 20, 30 ou mais alunos. São tantos príncipes, princesas em uma sala, são tantas vidas que ele precisa considerar em toda sua plenitude. Mas não importa, nós pagamos impostos e ele ganha para isto. Ele ganha para ser perfeito.

Médicos, policiais, e tantos outros profissionais que trabalham diretamente com a vida também precisam ser perfeitos e mesmo assim ocorrem incidentes. Pais, mães, com todo seu amor, com toda sua atenção, mesmo cuidando de um único ou de poucos filhos,  cometem erros, mas com o professor não permitimos isto. Se ele errar é rechaçado. Basta ele errar uma simples vírgula.

https://minutodosaber.com/2011/11/o-professor-
sempre-estara-errado/
Hoje, se o professor chama um aluno ao quadro para explicar a matéria, está constrangendo. Se não o chama, o está discriminando. Se o aluno vai bem, mérito da criança, da família (e é óbvio que grande parte do mérito é deles), mas se vai mal, a culpa é exclusiva do professor. O professor está sempre errado !

São tantas coisas erradas nas escolas e temos sim o direito de reclamar, mas para não me prolongar, citarei apenas mais uma. É errado um professor, além das horas de sua jornada de profissional  dedicadas ao aluno, levar trabalho para casa. O professor, muitas vezes, deixa de lado sua família, seus próprios filhos, sua saúde, seu lazer, seu descanso, deixa de preparar sua alimentação, para preparar aulas. Prepara com todo carinho trabalhos, provas, as corrige, pensa em cada aluno e nas particularidades deles. Investe seu próprio salário em material. Faltam recursos em tantas escolas, mas seus profissionais se unem, promovem eventos fora de seu horário de expediente, dão um jeitinho por amar a profissão. Professor é professor 24 horas por dia. A família aprende a lecionar junto com ele.

Porém, como pagamos impostos, se entre o choro do próprio filho, se entre uma louça lavada e um arroz no fogão, o professor errar uma vírgula na atividade que prepara, temos o direito de reclamar, de julgá-lo como mau professor, de expô-lo. 

De fato, as leis que visam a agradar, atender ou regulamentar a sociedade, dão a todos nós o direito de reclamar. Porém, antes das leis e sendo fontes orientadoras delas, estão os princípios básicos como a moral e a ética. E antes destes princípios, está o bom senso, a necessidade de respeitar o ser humano.

Talvez mais importante que ensinar aos nossos filhos as dificuldades ortográficas, a colocação pronominal ou o uso de uma vírgula, esteja na hora de gastarmos nosso tempo ensinando respeito ao outro, empatia, amor ao próximo e a tolerância. Isto deveria vir antes, como alicerce de qualquer conhecimento. Antes dos direitos, como por exemplo, o de reclamar, sobre a pobre justificativa de que pagamos impostos, talvez esteja na hora de nos vermos como cidadãos, como humanos, afinal, mesmo que não pagássemos nada, assim mesmo mereceríamos respeito.

Então, vale a pena reclamar ou seria melhor agirmos como um professor, fazendo nossa parte e talvez, um pouquinho além? Como seria bom se todos pensassem no outro como fazem muitos dos professores !

Talvez os professores tenham errado mesmo. Errado em fazer além e transformar isto em regra. Errado em não ensinar que certos valores são mais importantes para a vida que certas regras gramaticais.

Talvez faça parte deste erro termos hoje um governo que está preocupado somente em que as escolas ensinem o básico, enfatizando Língua Portuguesa e Matemática, matérias de aplicação direta e imediata no mundo do trabalho.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB – expressa que a educação tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania, somente depois citando a qualificação para o trabalho.

Mas vemos atualmente a proliferação de propostas do governo, e infelizmente, vemos a aceitação popular, de direcionar esforços pura, rasa e simplesmente para formar mão de obra farta e consequentemente barata para atender ao mercado, cujas regras parecem ser divinas.

http://metalurgicos.org.br/noticias/noticias-
do-sindicato/charge-do-dia/
Um mercado que já tem a seus dispor milhões de desempregados, fora aqueles que desistiram de buscar emprego e fora os subempregados, ou seja, profissionais qualificados, mas que dado o excesso de pessoas em busca de emprego, se sujeitam a trabalhar por salários menores que os pagos em outros países ou mesmo em outras épocas atrás. Enfim, salários aquém do justo ou socialmente necessário.

Soma-se a este contexto as reformas que precarizam ainda mais as relações trabalhistas, tolhendo direitos e garantias, promovendo uma falsa meritocracia, como se todos partissem do mesmo ponto comum. E embasando todo este contexto, está a aceitação por uma parte da opinião pública, como se este pragmatismo capitalista e esta transformação do ser humano em mercadoria fosse salutar. Implantou-se uma idéia “gourmetizada” do empreendedorismo, de que a dificuldade social é culpa exclusiva do indivíduo.

Disfarça-se o desemprego e eleva-se o número de abertura de empresas transformando motoboys, jardineiros, pintores, outrora autônomos, em microempreendedores individuais. Até mesmo professores, em escolas privadas são contratados sob a forma de Pessoa Jurídica. Com isso, não é necessário pagar a ninguém horas-extras, férias, décimo-terceiro e nenhum outro benefício. O trabalhador fica a mercê das necessidades e da demanda da empresa, sem garantias, sem sequer ser visto como pessoa, mas somente como recurso, que deve ser barato, farto e substituível, quase que descartável.

A educação não visa apenas vincular-se ou submeter-se ao mundo do trabalho, mas como a própria LDB expressa, deve se atrelar à prática social.

Isso justifica a necessidade de um governo, que serve aos interesses do capital, de abandonar a preocupação de ensinar disciplinas que dão ao aluno uma visão crítica de mundo, disciplinas que formam cidadãos plenos, com autonomia intelectual e assim, aceitar mais facilmente esta submissão ao capital, cujo lucro cada vez fica mais concentrado nas mãos de poucos, enquanto a pobreza, a desigualdade, e tantas outras mazelas se alastram aos aplausos de parte da sociedade.

Está na hora da sociedade rever seus valores. Está na hora do conhecimento se transformar em fonte de justiça, de fraternidade, de sabedoria e não de ferramenta para manutenção do status quo, de desigualdades, de egoísmos e egocentrismos.

Talvez, mais que ensinar Língua Portuguesa e  Matemática, como prioriza o governo, talvez mais que ensinar Geografia, História, Sociologia e Filosofia, como exige a prática social, as escolas precisem ensinar a sermos mais humanos, a resgatarmos certos valores, a termos ética e abandonarmos a malandragem e o jeitinho que marca nossa cultura, de um lado, e a ingenuidade, que nos submete aos anseios dos poderosos de outro.

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