Que os bancos apresentam lucros exorbitantes, todo mundo
sabe. Mas poucos refletem como isso acontece e como a sociedade contribui para
esta extrema lucratividade. Obviamente, isso é uma questão complexa, passando
por estratégias territoriais, estratégias legais, macroeconômicas,
influenciando e sendo influenciada por questões sociais, como o consumo,
emprego e renda, tecnologia da informação, até pelos hábitos culturais (povo
mais ou menos poupador ou mais ou menos consumidor).
Como é impossível tratar de todo esse emaranhado conceitual
em um único texto, buscar-se-á enfatizar a questão da lucratividade bancária
através da captação de recursos da sociedade e seu posterior empréstimo, com a
diferença da taxa de juros entre estas operações gerando simplificadamente o spread bancário.
Só para dar uma noção da lucratividade do bancos, o site Globo.com. destaca que “a soma do lucro registrado por quatro bancos brasileiros em 2013, que chegou a cerca de US$ 20,5 bilhões, é maior que o Produto Interno Bruto (PIB) estimado de 83 países no mesmo ano, segundo levantamento feito com base em dados do Fundo Monetário Internacional”.
O site da
Federação dos Empregados em Estabelecimentos Bancários do Paraná (http://www.feebpr.org.br) também traz alguns
dados, tabelados e apresentados a seguir, referentes ao ano de 2012:
Inclusive, como estratégia de reduzir às críticas sociais quanto aos efeitos destas mudanças, os bancos investem em propagandas que estimulam e demonstram o quanto o sistema de autoatendimento é moderno, rápido, seguro, sem obviamente, demonstrar os reflexos sociais, econômicos e até mesmo culturais que acarretam. Leia a postagem "Desemprego estrutural" existente neste blog, clicando aqui. O gráfico abaixo indica que o autoatendimento, o atendimento automático e o internet banking foram os tipos de transações bancárias predominantes.
Outra estratégia facilmente verificável é a pulverização
das agências bancárias no território brasileiro no decorrer dos anos.
Anteriormente, por volta dos anos de 1960, apenas os grandes centros eram
atendidos por grandes redes bancárias, especialmente as particulares. Mas com a
cultura do consumo a prazo, onde o cliente paga juros astronômicos para obter
financiamentos de bens de consumo, se tornou viável para as redes bancárias
atuar em cidades menores. Lembrando que o setor produtivo, para se manter
competitivo e lucrativo, depende da demanda por seus produtos e serviços. Suas estratégias de marketing e suas publicidades também estimulam o
consumismo, influenciado pela oferta de crédito.
É importante aqui frisar a diferença entre consumo e consumismo. Segundo o site Brasil Escola "no consumo, o ato de comprar está diretamente relacionado à necessidade ou à sobrevivência. Já quando se trata de consumismo, essa relação está rompida, ou seja, a pessoa não precisa daquilo que está adquirindo"
Os processos de acumulação de capital resultam no aprofundamento dos desequilíbrios regionais, já que o território, organizado também segundo os mesmos interesses (privados), acaba por constituir-se em um meio técnico-científico e informacional seletivamente funcional às atividades hegemônicas do capital e da política.
Para Scherma e Kahil (2011), diante da histórica situação
geográfica de desigualdade regional brasileira, a análise do sistema financeiro
destaca a questão da desigual distribuição do dinheiro, tanto em relação a
instalação dos fixos bem como a dinâmica dos fluxos do sistema financeiro
em território nacional.
Para Scherma e Kahil (2011), contudo, apesar desse
vertiginoso crescimento no número de agências e a expansão para áreas de
ocupação periférica, o território brasileiro ainda apresenta, neste início de
século, grandes desigualdades.
A reorganização do sistema bancário (1988) resultou em uma
configuração espacial muito mais seletiva. Regiões mais pobres e menos povoadas
voltariam a ser interessantes para o sistema financeiro somente diante da
possibilidade normativa de novas formas de topologia bancária: os
correspondentes bancários, as lojas de crédito e o banco postal
E onde não é viável ter uma agência, utiliza-se a figura
dos representantes e dos correspondentes bancários. Mais uma forma de obter
lucros com pouco investimento. O gráfico da Febraban aponta que, entre 2006 e 2010, a rede
de atendimento "correspondentes não bancários" cresceu mais de 120%,
enquanto, no mesmo período, o número de agências cresceu menos de 10%,
demonstrando a utilização dessa estratégia para a pulverização da oferta de
crédito e demais produtos e serviços bancários em todo território nacional.
Poderíamos ainda trabalhar com outros dados. Verificar, por
exemplo, se com o aumento da "financeirização" da sociedade,
elevou-se o número de empregados no setor bancário. Poderíamos analisar
a questão do endividamento e da inadimplência, entrando, inclusive, nos
aspectos culturais e psicológicos das relações de consumo e da dependência da
sociedade com o setor bancário / financeiro.
Milton Santos e Maria Laura Silveira (2006, p.185) afirmam
que as expansões e retrações do sub-sistema bancário nacional seriam uma
manifestação do comando do sistema financeiro sobre a economia, bem como,
comando do território, já que a produção e o consumo se tornam cada vez mais
dependentes das condições e da oferta de crédito
Para Milton Santos e Maria Laura Silveira a sociedade é chamada a consumir produtos financeiros, como
poupança e crédito. Com isso, o sistema financeiro ganha duas vezes: capta um
dinheiro social e lucra emprestando.
Na contra-mão, e ao mesmo tempo paralelamente a esse
contexto, especialmente nos últimos anos, há incentivos por parte de uma série
de organismos voltados às finanças pessoais, inclusive as escolas, enfatizando
a importância de poupar.
Obviamente, saber distinguir o que queremos do que
precisamos, e gastar o dinheiro com parcimônia é uma atitude ou um
hábito saudável. Mas juntamente com o hábito de poupar, surge o impulso
contraditório estimulado, em grande parte pela mídia e tornando
parte do senso comum, do incentivo ao consumo dos produtos financeiros, com
parte do ato de poupar. Ou seja, não se trata apenas de não gastar, mas impõe a
necessidade de investir o dinheiro esperando um retorno pelo adiamento do seu
gasto.
Até mesmo a mais inocente, simples e conhecidíssima dos brasileiros, a Caderneta de poupança, se não esconde algumas armadilhas, contribui para a lucratividade dos bancos ao mesmo tempo em que relativamente pouco contribui com o poupador (em termos de lucratividade).
Entretanto, como via de regra, não se pode descartar as ações políticas, tanto no sentido de favorecer ou estimular direta ou indiretamente a lucratividade dos bancos através das operações destes com seus clientes privados, quanto com o próprio governo. Por exemplo, quando o governo eleva a taxa básica de juros (Selic) (Clique aqui e acesse a postagem que explica a Selic) para conter o processo inflacionário, automaticamente eleva os valores pagos em juros decorrentes da dívida pública.
Como bem ressalta a Jaciara Itaim, colunista da Carta Maior, "no Brasil o financismo se impõe
através dos meios de comunicação, das universidades, das instituições de
pesquisa e das áreas econômicas dos governos. Seu discurso e sua lógica de
funcionamento são incorporados pelos formadores de opinião e pelos formuladores
de políticas públicas como se fosse algo “normal”. Esse processo de
naturalização da exploração (...) transforma os bancos em
entidades simples, que como todas as demais produzem muito, contribuem para o crescimento da economia e
ainda - coitadinhos! – têm de pagar impostos.
Carta Maior relembra que há ainda as benesses da legislação tributária, a qual contraditoriamente oferece diversas formas (planejamento tributário) para que as empresas não sejam alcançadas pela
incidência dos tributos. Como nosso sistema impositivo é descaradamente
regressivo, as camadas de menor renda – os assalariados basicamente – acabam
contribuindo muito mais para o fisco do que os detentores do capital.Ou seja, o trabalhador paga proporcionalmente mais impostos que as as classes mais ricas ou grandes corporações.
A figura abaixo ilustra quanto do orçamento federal para 2014 será destinado ao pagamento de juros e amortização da dívida pública. Os quase 43% representam em torno de 1 Trilhão de reais, o que faz com que sobre percentuais significativamente menores para as demais áreas da atuação pública ou que a população seja pressionada a pagar cada vez mais tributos para resolver os problemas de caixa e de falta de planejamento do governo.
Só para ilustrar um pouco da história da caderneta da poupança, que pode ser acessada no site do Banco do Brasil, tem-se o seguinte resumo:
A caderneta de poupança foi, por muito tempo, a melhor opção
para investimentos na opinião de muitos brasileiros.. Era uma alternativa para
proteger o dinheiro da desvalorização. Com o Plano Collor, no início da década
de 1990, a credibilidade histórica da poupança ficou abalada pelo congelamento
de sua liquidez.
Ainda com a credibilidade em baixa, com o Plano Real veio a
necessidade de o governo captar dinheiro no mercado para compensar o déficit
público e a perda das receitas advindas da desvalorização da moeda. A caderneta
ainda sofreu com a concorrência de outros produtos mais rentáveis.
Entretanto, a enorme simplicidade da aplicação em caderneta
da poupança e a liquidez total fazem com que ela se torne ainda mais atrativa.
Em especial, para as aplicações de prazos mais curtos e para aquela parcela de
dinheiro reservada para eventuais emergências e que não pode correr riscos.
Até mesmo o importante aspecto social de parcela dos
depósitos da poupança serem aplicados em financiamentos imobiliários tem sua
lógica contraditória no sistema financeiro. Ainda segundo o site do Banco do
Brasil:
Mas também há pontos negativos. Como 65% dos depósitos em
caderneta de poupança devem ser usados pelas instituições no financiamento de
imóveis, o crescimento exagerado nos depósitos é preocupante. Quando grandes
aplicadores migram para a poupança, eles também podem vir a sair rapidamente em
busca de aplicações mais rentáveis. Como as aplicações para financiamento de
imóveis têm prazos muito longos, esta instabilidade não é desejável. Assim,
caso a economia continue em seu ritmo de melhorias constantes e os juros
continuem caindo, é possível que o governo precise tomar medidas para reduzir a
rentabilidade desta aplicação no futuro
Segundo o site IPEA (Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada), os depósitos em caderneta de poupança somaram R$
88,722 bilhões no mês de abril, com queda de 8,07% em relação ao mês anterior,
enquanto os saques atingiram R$ 87,025 bilhões (-9,32% que em março). O
saldo positivo das cadernetas de poupança foi de R$ 538,124 milhões em março, e
no mês passado o saldo aumentou para R$ 1,696 bilhão. Isso somado ao rendimento
creditado no mês, de R$ 1,593 bilhão, elevou o estoque total da poupança para
R$ 331,178 bilhões.
Ou seja, o presente texto, de modo superficial, permite
verificar que todo o sistema financeiro está integrado a todo o sistema
capitalista. Financiando desde a produção, a infraestrutura, até o consumo dos
bens necessários para realimentar o setor produtivo. Entretanto, esta atuação
não é isenta de interesses. Os capitais se direcionam para onde houver as
melhores condições para sua reprodução, e neste contexto, interferem nos
hábitos culturais, nas relações econômicas, sociais e políticas.
A questão política fica evidente na intencionalidade do sistema. Os territórios são demarcados e utilizados segundo o interesse e as possibilidades de ganho, o que fica claro com a espacialização das agências bancárias (especialmente as privadas) nas regiões mais ricas, nas décadas de 1960, 1970 até por volta da década de 1980, passando a atuar em cidades menores, nos anos de 1990 e 2000, aproximadamente, quando já havia condições de auferir lucros. E para obter esses lucros, diversas estratégias são empregadas,como as discorridas anteriormente, demonstrando apenas as facilidades e os reflexos positivos de tais mudanças.
SPREAD BANCÁRIO
Depois deste texto tratando da espacialidade e das relações do sistema financeiro com a sociedade, de forma mais prática, as tabelas abaixo apresentam como se dá o Spred bancário. Mais um dos fatores que contribuem para a grande lucratividade dos bancos. Ou seja, mais uma das diversas estratégias (implícitas ou explícitas) que garantem a lucratividade dos bancos e a dependência da sociedade, compelida a consumir financiada por créditos de terceiros, ou propelidas a consumir produtos e serviços financeiros, sendo instrumento da lucratividade dos bancos, na medida em que estes captam recursos da sociedade para intermediar e obter o seu retorno.
A sociedade é chamada a consumir produtos financeiros, como
poupança e crédito. Com isso, o sistema financeiro ganha duas vezes: capta um
dinheiro social e lucra emprestando.
Os bancos captam recursos da sociedade para promover suas
operações. Ou seja, pegam recursos de quem tem (pagando juros) e emprestam esse
dinheiro para quem necessita e tem condições de pagar (cobrando juros). A
diferença destas taxas de juros, sempre favorável ao banco, chama-se spread
bancário.
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