Muitos impostos e pouco retorno. Onde estão os meus direitos ?

Muitos impostos e pouco retorno. Onde estão os meus direitos ?


Assista o video clicando aqui, já que os videos da Globo não podem ser veiculados no Youtube.

          
  Vivemos uma época em que o senso crítico das pessoas, parece, pontualmente, estar maior. A população está mais consciente de seus direitos, fiscaliza e cobra uma eficiente gestão dos recursos públicos, reivindica, etc. Mas quanto aos deveres e obrigações há a mesma lógica ?
            Segundo o discurso massificado, a população cumpre suas obrigações pagando impostos - e muito - por isso têm tantos direitos. Mas será que a situação é tão simples assim ?
              É óbvio que os dados revelam que o brasileiro arca com uma pesada carga tributária, prevista para 2013, como algo em torno de 35% do PIB, ou seja, de tudo que é produzido no Brasil. Por outro lado, divulga-se que o retorno é ínfimo. A saúde é precária, a educação também. Mas será que a educação é precária mesmo ? Quem faz esta afirmação se baseia em que dados para avaliar a qualidade do Ensino Público ? E quais fatores influenciam nessa suposta precariedade ?
              Será que a questão é tão simplista assim, que já virou senso comum criticar o Estado ? Será que não está se tornando "cultura nacional" apenas exigir ?
           São tantos e diversos os direitos “concedidos” que se chegou ao ponto em que se justifica exibir uma matéria em um –ou talvez em mais -  jornal nacional sobre o fato de um aeroporto estar sem ar-condicionado.
Em dezembro faz muito calor, e suar um pouco seria normal. Mas na visão dos entrevistados, é uma falta de respeito, de desconsideração fazerem isso com a população. Afinal, pagamos (impostos) por tudo isso, dizem eles. E o pior, não pediram sequer desculpas pelo “transtorno” !
Eu também pago impostos, e parte do valor que pago sustenta a infraestrutura dos aeroportos que sequer uso. E sinceramente, preferia que minha parcela de tributos fosse aplicada para melhorar a saúde, para alimentar as crianças que passam fome em municípios com IDH piores que de países paupérrimos, do que atender certos comodismos ou exageros.
            Provavelmente, as ruas de muitas cidades estarão sujas de papel de presente e de latas e garrafas de bebidas decorrentes das festividades de final de ano. Com certeza, a sociedade culpará o serviço público por tamanho descaso. Afinal, pagamos muitos impostos. Mas poucos terão a consciência de que é a própria população que joga o lixo nas ruas, que com a primeira chuva é arrastado para o bueiro, para o córrego, contribuindo com os alagamentos, com a proliferação de doenças, quando então, mais uma vez irão dizer: é culpa do governo. Pagamos impostos e temos que enfrentar enchentes !
            Em Irati reclamou-se da
falta de decoração natalina (Clique aqui e  leia a matéria no site da Rádio Najuá). Em muitas cidades, por outro lado, as associações comerciais incentivaram e promoveram a decoração das vitrines e fachadas pelos próprios comerciantes. Afinal, quem sairia ganhando com isso é o comércio. Sendo assim, é relevante aplicar dinheiro público neste tipo de ação?
Talvez, se a população fizesse mais a sua parte, o dinheiro dos impostos pudesse ser melhor aplicado em áreas realmente de interesse coletivo e que deveriam ser o foco e objetivo da ação estatal, como a saúde, a educação, a segurança e a infraestrutura. Talvez, se deixássemos de lado a visão de que o Estado tem que ser paternalista, ele não fosse tão inchado, repleto de órgãos, de cargos e de toda estrutura (que custa muito) para mantê-lo. Talvez, não fosse tão fácil “cultivar” eleitores com medidas e discursos populistas. O Estado tem se tornado um pai e a sociedade uma criança fragilizada, que depende de tudo para sobreviver.
É óbvio que não se trata de defender o modelo hegemônico neoliberal de Estado Mínimo, pois desde o Pós-Guerra as políticas sociais mostraram sua importância e validade (inclusive no Brasil) e diversos autores defendem as funções distributiva e redistributiva (direta e indireta) do Estado. Trata-se, porém, de analisar o papel ideológico embutido nos discursos vigentes.
Sader (2005) já atentava para o fato do Estado ser um organismo no qual existe uma complexa gama de atividades práticas e teóricas com que a classe dirigente justifica e mantém o seu domínio sobre os governados.
É neste ponto que podemos compreender a raiz do discurso da “população pagadora de impostos”, repleta de direitos, que culpa o governo até mesmo pelo calor do verão. Como forma de obter a aceitação e simpatia de uma sociedade surrada pela deficiência de serviços fundamentais (saúde, para citar um exemplo), marcada pela desigualdade social (7ª economia, mas com um IDH em 84º em 2011, perdendo para países como Equador, Santa Lúcia, Peru, etc.), a classe política lança o discurso dos direitos para apaziguar a população, para dar a impressão de que ela está no poder. Ou no mínimo, para tirar deles mesmos o foco dos problemas.  De fato a população tem direito, mas também tem muitas responsabilidades que deveriam se tornar mais recorrentes nos discursos.
O problema é que o cidadão vai até um Pronto Atendimento e não consegue marcar uma consulta. Como ele tem direito, o ataque de indignação (e até de violência) é dirigido contra o responsável pelo atendimento. Entretanto, os formadores de opinião não alertam a população de que o responsável pelo atendimento não é o mesmo responsável por contratar mais médicos, por ampliar as instalações, por definir as escalas, por licitar medicamentos, etc. O cidadão esquece que o próprio dirigente político, muitas vezes vinculado à classe hegemônica e aos meios de informação e de formação de opinião (e às vezes, até de manipulação) é o responsável pelas decisões, pela formulação de leis, pelas autorizações e pelas ordens. Então o cidadão reclama de tudo, mas não exige ou reivindica de quem assumiu o poder e não exerce verdadeiramente seus direitos (e aqui sim, o termo direito é perfeito). E por isso ele acha que paga tantos impostos pelos serviços que recebe. Porque há uma estrutura ineficaz que ele mesmo contribui para manter.
E a explicação, embora o problema seja complexo, pode ser facilmente simplificada. Cobrar o político é, em grande parte, assumir a responsabilidade. Afinal, os políticos são eleitos pelo voto da sociedade. Eles são colocados lá mediante a aprovação popular. E seu projeto de se manter no poder depende da manutenção dessa aprovação.
Infelizmente, esta aprovação está, em muitos casos, orientada por interesses e expectativas pessoais do cidadão. Se a população coloca o bem pessoal antes do bem coletivo, como esperar (conscientemente) melhorias sociais ? Resta então reclamar, agredir.
Acredito que está na hora da sociedade assumir seu papel de agente social.  Em “Um Gramsci todo dedicado à política”, o autor denomina a atual sociedade de massas de “sociedade global”, disforme e carente de coesão. Esta sociedade só se transmudará em uma verdadeira “sociedade civil” quando a maioria de seus membros pautar conscientemente suas ações sociais pelo mesmo conjunto de valores. Mas enquanto os interesses pessoais forem mais importantes e não houver uma força coesa capaz de refreá-los e orientá-los para o bem comum – uma sociedade consciente de seus direitos e deveres - , não podemos esperar milagres.
O que me incomoda é ver uma parcela da população conduzida pelo discurso de que tem todos os direitos, porém na prática obtém migalhas. E mais que isso, é ver que essa mesma população assimila acriticamente estes discursos prontos e exige daqueles que pouco podem fazer, enquanto deixam aqueles que realmente tem o poder (concedido pela própria sociedade) isentos.

É preciso analisar que se eu tenho direito a uma vaga na escola, a uma consulta médica, não é simplesmente porque pago impostos, mas sim porque toda sociedade está pagando por esse serviço que irei utilizar, inclusive o cidadão que está me atendendo. É preciso afastar essa idéia individualista, de exclusividade e de pessoalidade das ações públicas. Individualmente meus impostos não pagam nada. Os serviços disponíveis são decorrentes de uma orientação e de uma necessidade coletiva. E é impossível atender satisfatoriamente a coletividade quando se preza o individual.
Se estamos descontentes com esse rumo, é preciso exercer melhor o nosso direito (já que este é o termo da vez) de votar e de cobrar um projeto de governo para a coletividade. E individualmente, urge que o discurso pronto e fácil do “tenho direito, pois pago impostos” seja utilizado de forma mais consciente. Reclama-se tanto, como nos exemplos da figuras ilustrativas, do peso dos tributos, mas não se coloca na balança o peso do voto. Aceitamos o discurso pronto da classe empresarial de que são massacradas por tributos, mas esquecemos que a maioria, recai sobre o consumo, perguntamos aos amigos para onde vai nosso dinheiro, mas não acompanhamos as ações daqueles para quem votamos...Ou seja, reclamar parece ser um direito mais fácil de exercer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário