A redução da maioridade penal


 Recentemente comemorou-se a “maioridade” do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Seria interessante, em vez de comemorar, estudar revisões à matéria. O que dizer então de um Código Penal de 1940, época do ainda Estado Novo Getulista. 
A sociedade, seus valores, costumes e todas as relações decorrentes são dinâmicas e mudam com o tempo. As leis, responsáveis pela manutenção da ordem, do convívio mais próximo da harmonia e do bem estar coletivo, também devem acompanhar esse contexto.

Por mais inovador que o ECA tenha sido na tentativa de proteger a “pessoa em formação”, hoje o contexto é outro. Na época de sua formulação, os delinquentes, via de regra, cheiravam cola e “batiam carteiras” nos grandes centros. Muitos adolescentes não freqüentavam a escola porque eram obrigados a trabalhar.

Hoje, crianças de 12 ou 13 anos fazem a segurança armada das “bocas de fumo”, assaltam, matam, se tornam "aviõezinhos" do tráfico. A maconha, graças a discursos pretensiosamente liberais, é apresentada como se não fosse uma droga. O crack se alastrou por todas e cidades do país e em todas as classes sociais. Alunos estão nas escolas, mas armados. Professores e pais são agredidos.

Ou seja, o adolescente não pode trabalhar para não ser explorado ou prejudicado, mas pode votar, entrar em festas e perambular pelas ruas. Sem entrar no mérito, mas os pais não podem dar uma palmada para educar, mas os adolescentes podem ser espancados e assinados (e espancar e assassinar) por motivos torpes por esse Brasil afora.

Da mesma forma que o Estado não é capaz (ou a ele não interessa) de elaborar Leis de acordo com o atual contexto social, segmentos informais da sociedade se valem dessas brechas legais para explorar a juventude.

As estatísticas apontam que, entre outros fatores , após o surgimento do ECA, o número de jovens e adolescentes indiciados por crimes se elevou.  

Se outrora isso ocorria porque muitas vezes estes jovens sabendo da flexibilidade da Lei, assumiam crimes praticados por maiores, hoje, não só os jovens, como os adolescentes e até crianças, se sentem confortáveis em portar armas, em assaltar, agir com crueldade, e caso, se empolgue, executar qualquer pessoa: jovem, pai de família, mulher, idoso, seja porque reagiu ao assalto, porque não tem dinheiro no bolso ou porque estava no caminho do inconsequente. Segundo matéria no Portal O Globo, o envolvimento de jovens em crimes violentos é comum.


Acho engraçado quando alguns contrários à redução da maioridade, ou mesmo contrários à redução de impunidade, chamam bandidos estupradores, assassinos, latrocidas de 17 anos de crianças. Isso somente nos discursos demagógicos e ideologicamente enviesados pela alienação daqueles que não analisam a realidade. Dizem que o sistema prisional está falido e usam isso como justificativa para deixar criminosos impunes. Ora, se os hospitais estiveram cheios de doentes, irão parar os atendimentos, seguindo essa lógica ?
Para o promotor de Justiça Thales de Oliveira, o modelo atual, previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que determina a aplicação de medidas socioeducativas a jovens que praticam atos infracionais, leva a uma situação de “verdadeira impunidade”. “Em grande parte
dos crimes, quem o comete vai responder em meio aberto ou com liberdade assistida, sendo acompanhado por um assistente social, e ainda ter direito de participar de cursos profissionalizantes, configurando até uma espécie de favor que o Estado lhe presta”, disse.

Ele acrescentou que, mesmo quando é determinada a medida de internação, em que os adolescentes são privados de liberdade, o tempo máximo é três anos, com revisão obrigatória a cada seis meses. “Com isso, tem adolescente que fica na Fundação Casa [unidade de internação de jovens de São Paulo] por seis meses e já ganha sua liberdade. Trata-se de uma punição tão pequena e inócua que não posso chamá-la de uma verdadeira punição”, enfatizou.

Na verdade, não se trata apenas de reduzir arbitrariamente a maioridade civil ou penal. Se trata de reduzir a sensação de impunidade no Brasil. É preciso aplicar penas condizentes com a crescente gravidade e repetição dos crimes cometidos por menores.


Pior ainda, o perfil dos autores de homicídios dolosos (quando há intenção de matar ) é composto, essencialmente, por jovens e adolescentes. Segundo as estatísticas do registro civil, do ano de 2008, disponíveis no sítio do IBGE, do total de óbitos, 60% foram por mortes violentas quando se trata de jovens de 15 a 19 anos, e 34% quando se trata de adolescentes de 10 a 14 anos.

No site G1, consta que em um ano, o número de homicídios cometidos por menores de idade aumentou 20%, em Curitiba, de acordo com a Polícia Civil. O número reflete uma realidade cada vez mais comum na cidade. Na Delegacia do Adolescente, todos os 48 menores apreendidos que ainda estão sob a guarda da Polícia Civil foram detidos suspeitos de participar de crimes violentos.

Segundo o site Idifusora, os atos infracionais praticados por adolescentes aumentaram aproximadamente 80% em 12 anos, ao subir de 8 mil, em 2000, para 14,4 mil, em 2012 - diferentemente do que ocorre em relação aos crimes praticados por maiores de 18 anos, que vêm diminuindo na última década na cidade de São Paulo

Ou seja, a charge está correta em definir que muitos adolescente sequer chegam à maioridade ! Onde está a proteção da Lei ? Os dados confirmam que ela é falha em proteger e útil em entregar os jovens a própria sorte. Alega-se que o jovem não tem a responsabilidade para assumir seus atos, mas implicitamente a lei os deixa a mercê de suas próprias decisões, facilitando a transgressão ao cristalizar uma imagem de impunidade, flexibilidade, que estimula seus ímpetos, talvez até naturais para a idade. Explicitamente, mesmo afirmando que o jovem não pode responder como um adulto pelos seus atos, se dá a eles o direito de decidir o futuro do país através do voto, erigindo mais uma contradição.

Para Robson Luquêsi, em matéria na RevistaVeja, A razão mais forte para o fenômeno é a relativa impunidade de que gozam os menores no Brasil, graças a uma legislação que contempla mais a sociologia do que a criminologia – o Estatuto da Criança e do Adolescente. Quando um jovem desses é preso por ter cometido um delito pesado, já sabe que dificilmente permanecerá mais do que três anos detido. Aliás, o termo "preso" a rigor nem poderia ser utilizado. 

Ainda para Luquêsi, quem é contra a idéia costuma utilizar o argumento da "questão social". Que os desajustes socioeconômicos são grandes e devem ser combatidos, ninguém discute. Mas eles não podem servir de justificativa para a impunidade. Os mesmos que acham ser a pobreza uma atenuante indignam-se quando a riqueza é invocada para privilegiar um criminoso. Não percebem que se trata também de uma "questão social". Na verdade, trata-se de uma visão preconceituosa, de dizer que as causas sociais são as determinantes, quando temos no Brasil grande parcela da população vivendo com baixa renda e áreas periféricas, e a maioria esmagadora destes é honesta. Ao passo que temos ricos cometendo crimes de todas as espécies.

O Brasil é um dos raros países onde a maioridade criminal é de 18 anos. Na Argentina, por exemplo, o adolescente passa a ter responsabilidade por seus atos já aos 16 anos. Na Alemanha, na Itália, no Japão e na Rússia, a responsabilidade inicia-se aos 14 anos.

É preciso criar alternativas que afastem os jovens do mundo da marginalidade, e entre elas, devolver o poder coercitivo da lei. Se o Estado é incapaz de fiscalizar e proteger, é preciso criar leis que inibam a entrada desses jovens para o crime. Os jovens sabem que as medidas cabíveis a eles não podem ser chamadas de coercitivas. Um jovem de 17 anos que mata fica quanto tempo privado da liberdade ? O que rouba ou espanca, em muitos casos, sequer é detido.

Alguns defendem que o sistema e as punições não recuperam. Mas a flexibilidade da lei tem se mostrado senão inútil, incentivadora de crimes. As “medidas sócio-educativas” não impõem medo, ao contrário, são um convite para o jovem se valer da flexibilidade da lei ao mesmo tempo que não educam ou ressocializam o adolescente.

É preciso leis que façam com que o jovem pense, não uma, mas dez vezes antes de praticar um crime. É preciso que ele saiba que será punido, que há leis, que há justiça. O jovem não tem que ser recuperado pelo sistema carcerário. Ele precisa não entrar no sistema, seja por conscientização, seja pela certeza da punição cabível.
Outros defendem que o jovem de 16 anos não tem plena consciência do que faz. Talvez na época do surgimento do ECA, ou nos anos 40, quando da criação do Código Penal, não tivesse. Hoje a informação é abundante, as escolas não se preocupam apenas com a formação escolar, mas com uma série de temas paralelos. O jovem é muito bem instruído, tanto que escolhe sua faculdade, tem o direito de votar e de participar ativamente da vida social e política.

Deixo minha pergunta aos jovens: Vocês concordam que com 16 anos vocês não são capazes de arcar com a consequência de seus atos ? Ora, se são incapazes, cassem-lhes os títulos de eleitores (afinal, apesar da política ter conotação humorística no Brasil, é tema sério) e deem maior poder aos pais para educá-los como crianças que são !

Medidas como educação, conscientização, podem até ter uma conotação mais estética e valorizadora das qualidades humanas, mas demandam tempo, investimento e boa vontade. E a questão da violência é urgente, cabendo também medidas urgentes, como as adotadas em diversos outros países.

Para o promotor Carlos Eduardo Fonseca da Matta, 40, da 3ª Procuradoria de Justiça de São Paulo, em entrevista à Revista Superinteressante, as penas previstas no Código Penal, demasiadamente brandas, são a maior causa do descontrole da criminalidade. “A legislação penal brasileira é muito atrasada e extremamente favorável aos criminosos”, diz da Matta. Autor de uma proposta com medidas de combate à criminalidade aprovada por unanimidade pelo Órgão Especial do Colégio dos Procuradores do Ministério Público de São Paulo, da Matta tem idéias polêmicas, que vão da redução da idade de responsabilidade penal à adoção de penas longas de até 40 anos. O promotor paulista também defende um endurecimento das penas para reincidentes, a exemplo do que existe nos Estados Unidos. “Lá, após três condenações, o sentenciado por um crime grave é colocado definitivamente fora do jogo”, 

ELEVAÇÃO DOS ÍNDICES DE CRIMINALIDADE ENTRE JOVENS E ADOLESCENTES: RESULTADO DESSA NOVA ABORDAGEM ? 

Eis os primeiros indícios de que essa abordagem não está apresentando resultados positivos, ao contrário, a sensação de impunidade aliada a outros fatores socioeconômicos está criando uma geração de adolescentes e jovens inconsequentes, e o pior, criminosos. E isso coloca em risco os próprios jovens, cuja legislação se mostra incapaz de proteger.


Ou seja, a partir do momento que essas medidas sociológicas passaram a ser tomadas, o número de mortes violentas teve um significativo aumento percentual.

Segundo a Folha de São Paulo, transcrita no site do deputado Paulo Rubem, o levantamento de Estatísticas do Registro Civil do IBGE de 2006, mostra que a morte de homens de 15 a 24 anos por causas violentas representou 67,9% do total de óbitos. Dados semelhantes aos de 2005, quando 68,2% dos óbitos registrados foram atribuídos a mortes não naturais.


A região Sudeste lidera, com uma proporção de mortes violentas de 75,9% para jovens de 15 a 24 anos. A segunda região com maior proporção de mortes não-naturais é a Sul (70,7%).

Segundo Castro, em matéria no Portal O Globo, o envolvimento de jovens em crimes violentos é comum no Brasil. Pior ainda, o perfil dos autores de homicídios dolosos (quando há intenção de matar ou se tem consciência do risco de provocar a morte da vítima) é composto, essencialmente, por jovens e adolescentes.

Além disso, Segundo levantamento da Secretaria Nacional de Segurança Pública, onde adverte Castro, não estão incluídos os dados dos Estados do Rio Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul, os mais violentos do país, os jovens entre 18 e 24 anos responderam por cerca de 40% dos homicídios dolosos ocorridos no país no período.

Os números também mostram a grande incidência de menores envolvidos nesses crimes. Os adolescentes com idades entre 12 e 17 anos responderam por cerca de 11% do universo de agressores em 2004 e 2005. Somadas as duas faixas etárias, os adolescentes e jovens responderam por mais da metade dos homicídios dolosos nos dois anos (2004 e 2005).

Outro dado apontando pelo Portal O Globo é o número de crianças com menos de 11 anos envolvidas em homicídios dolosos. No ano de 2004, foram 26 e em 2005, 23. O perfil do agressor típico apontado pela estatística, que considera crimes como estupro e lesão corporal, é homem com idade entre 12 e 30 anos. Alerta-se, porém, para o risco de inclusão indevida de menores nos registros policiais como tentativa de proteger os adultos envolvidos, o que é mais um problema relativo à proteção legal dada aos adolescentes.

A íntegra da pesquisa pode ser lida na página do Ministério da Justiça, no endereço:


Buscando informações diretamente na fonte, as Estatísticas do Registro Civil do IBGE, para o ano de 2008, apresentam, entre outros dados, os exemplificados a seguir, os quais falam por sí mesmos.

No meio de todo esse problema, que inegavelmente existe, está a sociedade, cada dia mais refém de si mesma. Diversos outros problemas assolam a sociedade, como causas e como conseqüências de outros problemas. Porém, a responsabilidade é social, é de todos. Enquanto vemos a mídia transmitir por meses casos particulares, fofocas, tragédias, coisas muito mais relevantes, que nos afetam diretamente, são decididas, segundo interesses particulares.

É hora de pensar se este caminho para o qual nós e as gerações futuras caminhamos é o que queremos, e sobretudo, se é o melhor. Do contrário, é hora de agir.
Enquanto se discute uma lei, que provavelmente ficará no papel por falta de aparatos para fazer cumpri-la, toneladas de documentos que podem comprovar fraudes desaparecem no Paraná....

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Fontes dos dados:


REZENDE, J. Jurista critica proibição da palmada em crianças. Hoje em dia. 26-07-2010. http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/minas/jurista-critica-proibic-o-da-palmada-em-criancas-1.150156#

PORTAL TERRA. Educadora: "Lei da palmada" é redundante, invasiva e inócua. 29-07-2010. http://www.jb.com.br/editorias/Pais/.

SANTIAGO, P. R. IBGE : jovens e mortes violentas. 06-12-2007. http://paulorubem.com.br/B

CASTRO, L. C. O Globo Online. Jovens lideram estatística de homicídios dolosos no Brasil.

CARDOSO, O. P. História Hoje. 6ª Série. São Paulo: 2010. Ed. Ática.

IBGE. Estatísticas do Registro Civil. 2008.

Um comentário:

  1. Hoje (16/04/13), no Jornal Bom Dia Paraná (se não me engano), Olympio de Sá Sotto Maior procurador-geral de Justiça do Paraná, veio defender o Estatuto da criança e do Adolescente e a Manutenção da maioridade penal aos 18 anos.
    É óbvio que cada caso é um caso e que as crianças e adolescente necessitam de proteção e de prioridades, mas não se pode tapar o sol com a peneira.
    Segundo Sotto Maior, apenas 8% dos crimes (atos infracionais) são cometidos por menores. Um número que ele considera baixo. Gostaria de ver a opinião de especialistas se entre estes 8% (vidas transformadas em números) estivesse entre as vítimas familiares deles.
    Disse ainda que é um engodo ideológico dizer que o ECA não prevê sanções. É óbvio que prevê. Mas eu me pergunto: 6 meses, podendo ser reavaliado e sair livre ou ficar no máximo 3 anos cumprindo "medidas socioeducativas" é a punição justa para um menor que mata e sai dando risada, que estupra, que ateia fogo em vítimas ou que comanda, com 14 anos, o tráfico, como mostrado ontem no Jornal Nacional, o caso de Santa Catarina, onde o infrator era reincidente, tinha comprado carro e moto para operar seu "negócio" ?
    E ainda outro argumento de Sotto Maior, muito batido também pelos defensores do paternalismo. Se mandarmos um menor para a prisão, ele voltará para a sociedade pior. Eu pergunto: Existe pior que os crimes que alguns menores já estão cometendo ? Um delegado dando depoimento a um Jornal de TV diz que os flagrantes envolvendo menores não passavam de 2 por semana há uma década. Hoje, são dois por dia.
    Enfim, Sotto Maior coloca os adolescente e crianças como vítimas da sociedade, distorcendo a realidade, onde a sociedade se vê cada vez mais acuada pelo crime. Crime que não se restringe aos menores, tendo em vista que os menores crescem e hoje são maiores com larga experiência criminal. Criados com a sensação de impunidade.
    Estes especialistas, tinham que sair dos números (já alarmantes), da visão sociológica distorcida em paternalismo de que bandido é vítima, de que as condições sociais são as culpadas (então como ricos se tornam criminosos ?), deixar as ideologias de lado, e atender a quem realmente importa: a sociedade.
    E ideologia, é colocar na CAPA do ECA crianças felizes soltando pipa, quando na realidade, temos jovens com camisetas no rosto empunhando pistolas.

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