Em linhas gerais, o aborto é definido como a interrupção da gravidez, resultando na remoção ou expulsão prematura de um embrião ou feto do útero, o que leva à sua morte, ou é causado por essa intervenção.
Essa interrupção pode ocorrer de forma espontânea, quando não há intenção deliberada da grávida ou de terceiros, ou de maneira artificial, mediante a utilização de técnicas médicas, medicamentos ou procedimentos cirúrgicos, entre outros.
No Brasil, em conformidade com a legislação vigente, o aborto é considerado crime, seja quando praticado de forma autônoma pela gestante (autoaborto) ou quando realizado por terceiros. No entanto, a lei prevê três
exceções a essa regra geral:
1 - Quando a gravidez resulta de estupro;
2 - Quando não há outro meio de salvar a vida da gestante;
3 - Em alguns casos de anencefalia fetal (quando o feto não possui cérebro).
E aqui estamos citando o aspecto legal. Poderia haver, e há polêmica, se for levado em conta o aspecto ético, biológico, religioso, sociocultural, etc. Embora a Justiça em suas decisões não sejam isentas destas pressões. Afinal, a Justiça se baseia em Leis, formuladas por pessoas com opiniões e interesses. E ela ao interpretar o ordenamento jurídico (ou até mesmo ao inovar no mundo jurídico) também sofre as mesmas influências, afinal, todos os sistemas sociais são compostos por pessoas.
O aborto legal ou necessário, permitido por lei, depende exclusivamente do consentimento válido da mulher. Entretanto, mesmo com essa permissão expressa, diversas matérias ressaltam que médicos frequentemente se recusam a realizar o procedimento, alegando objeção moral.
Além disso, a infraestrutura adequada para o aborto seguro é escassa, e os profissionais de saúde frequentemente exigem que a mulher obtenha autorização judicial, registre um boletim de ocorrência ou passe por uma avaliação de uma Junta Médica, criando empecilhos materiais e psicológicos em um momento de extrema vulnerabilidade e tensão.
É crucial ressaltar que não há condições impostas para a realização do aborto legal, mas devido às barreiras existentes, muitas mulheres recorrem ao aborto inseguro, o que contribui para uma alta taxa de mortalidade devido a procedimentos mal realizados.
O aborto seguro é aquele realizado dentro dos parâmetros legais, por uma equipe de saúde devidamente treinada e com o suporte de políticas e regulamentações adequadas, além de uma infraestrutura de saúde que inclua equipamentos e suprimentos necessários, garantindo um acesso rápido aos serviços.
A falta de implementação de políticas e infraestrutura para a realização do aborto seguro representa um risco para a vida e a saúde das mulheres no Brasil e no mundo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre 2010 e 2014, ocorreram cerca de 55 milhões de abortos no mundo, e 45% deles foram realizados de forma insegura. No Brasil, os dados relacionados ao aborto e suas complicações são incompletos. No período entre 2008 e 2015, houve aproximadamente 200.000 internações por procedimentos relacionados ao aborto a cada ano, sendo cerca de 1.600 por motivos médicos e legais.
Entre 2006 e 2015, foram registrados 770 óbitos maternos em decorrência de aborto como causa básica, sendo que esse número poderia ser 29% maior anualmente se óbitos com menção de aborto e outras causas básicas fossem considerados nas estatísticas.
Embora os dados oficiais de saúde não permitam uma estimativa precisa do número de abortos no país, estudos identificaram um perfil de mulheres com maior risco de óbito devido ao aborto. Isso inclui mulheres negras e indígenas, com baixa escolaridade, com menos de 14 ou mais de 40 anos, residentes nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, e aquelas sem parceiro.
É importante destacar que nem todos os casos de aborto ocorrem pelas razões legalmente previstas. Diversos motivos podem levar uma mulher a buscar o aborto, como ter uma prole maior do que o planejado, dificuldade no acesso a métodos anticoncepcionais modernos, falta de orientação em planejamento familiar, baixo nível de educação e comportamento sexual de alto risco, entre outros.
É crucial enfatizar que o aborto não deve ser visto como um método contraceptivo. Em um mundo com maior acesso à informação e com distribuição gratuita de certos recursos, muitos casos de gravidez podem ser evitados. Embora, tenha que se ser ressaltado, que o conservadorismo e reacionarismo religioso, em alguns casos, chegam ao extremo de desestimular ou até talvez proibir o uso de anticoncepcionais e preservativos.
Além disso, mulheres também podem recorrer ao aborto devido a relações sexuais não voluntárias, violência sexual, coerção nas relações sexuais ou gravidez forçada.
Assim, sociologicamente falando, muitos estudiosos e entidades consideram que discriminar uma mulher que busca o aborto seguro representa uma dupla penalização, uma vez que o aborto é a quarta principal causa de mortalidade materna.
Portanto, é fundamental reavaliar a abordagem à saúde da mulher, indo além da simplificação de considerar o aborto como crime. Esta é uma questão de saúde pública que deve ser avaliada de forma moral e ética, além de objetiva e racional, sem ser influenciada por ideologias ou preconceitos que possam distorcer a realidade. Ou mesmo havendo tais influencias, que todos os pontos de vista, estudos, estatísticas e o contexto de vida destas pessoas sejam consideradas a fundo.
A discussão sobre o aborto é complexa, envolvendo opiniões pessoais, valores religiosos, evidências científicas, saúde pública, direitos das mulheres, questões de gênero e uma gama de perspectivas políticas.
É preciso sair dos tabus e opiniões fechadas e entender todo este contexto complexo, delicado, que envolvem direitos não só da mulher, mas do nascituro, que envolve sentimentos, valores, que mexe com as emoções, com a religiosidade, com a noção de certo ou errado de cada um. E por ser algo tão complexo, julgamentos baseados em visões parciais em nada colaboram.
Portanto, é necessário considerar não apenas a palavra "aborto" nessas discussões, mas também as circunstâncias em que ele é aplicado e os elementos adjacentes envolvidos. Essa é uma discussão que provavelmente nunca será pacífica, mas que exige um debate aberto e informado para encontrar soluções que garantam a segurança das mulheres e o respeito aos seus direitos, bem como do nascituro, além da necessidade de preservar valores socialmente relevantes em compasso com a Justiça e o ordenamento jurídico, e ainda, em consonância com a Ciência e a Medicina. Qualquer visão parcial não passa de julgamento.
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