Proposta legislativa: redução da jornada de trabalho

Tendo em vista a necessidade dos municípios conterem as despesas com pessoal, as quais estão próximas do limite prudencial determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal em muitos deles, bem como, considerando a necessidade que a administração apresenta de ter um número maior de servidores, especialmente nos setores diretamente incumbidos de realizarem o trabalho técnico concomitantemente ao atendimento ao público (a linha de frente e o cartão de visitas da administração pública), seria salutar a abertura de concursos para a contratação de mais pessoas. No entanto, sabe-se que a ampliação do número de pessoal é conflitante com a necessidade de contenção de gastos. 

Modernamente, a sociedade (composta também pelos servidores) se mostra preocupada e inclui neste contexto a busca pela qualidade de vida, pelo maior tempo de convívio familiar, pela necessidade crescente de tempo para capacitação (necessária para se manter apto ao exercícios das próprias funções públicas), pela necessidade de inserir os cuidados com a saúde, com a prática esportiva, entre outras ações, que de uma maneira ou outra, acabam afetando positiva ou negativamente a produtividade do servidor. Isto também impõe a necessidade da administração pública olhar a eficiência e a produtividade de forma ampla, considerando ações que as empresas mais modernas têm adotado e obtido resultados.

Assim, seria interessante a implementação de políticas que unissem a economia de recursos públicos, ampliassem o número de servidores para atender às necessidades da população e ao mesmo tempo garantissem maior qualidade de vida e de trabalho aos já efetivos, mantendo-os produtivos, motivados, qualificados e com condições de manterem a qualidade de vida em uma época em que o tempo é um dos produtos mais escassos e valiosos para todos, bem como chegarem à melhor idade em plenas condições de saúde.

Entre estas políticas, poderia ser proposto um projeto de lei que contemplasse, facultativamente aos servidores interessados, a possibilidade de solicitar a redução de sua jornada de trabalho de 8 horas diárias (40 semanais), por exemplo, para 7 ou 6, com a proporcional redução da remuneração (embora algumas empresas promovam esta redução de jornada sem a redução salarial). Está redução poderia ser, inclusive, temporária (1, 2, 3 anos, por exemplo), como se fosse uma substituta parcial de uma licença, dando ao servidor a possibilidade de realizar algum objetivo (cuidar da saúde própria ou de familiar, fazer um graduação, um mestrado, etc.) sem perder totalmente na remuneração.

Nesta postagem está o link para uma proposta que foi encaminhada à Câmara dos Deputados propondo a possibilidade de redução da jornada de trabalho dos servidores públicos que assim desejarem, com a respectiva redução proporcional do salário. 


O primeiro intuito é aumentar a oferta de emprego, condição relevante especialmente em épocas recessivas ou de crise (como atualmente, onde desemprego bate recordes e o número de desalentados, isto é, pessoas que sequer tentam conseguir ocupação, é drástico), favorecendo não apenas o desenvolvimento individual, mas social, melhorando a distribuição de renda, reduzindo desigualdades, melhorando o acesso ao consumo e com isso, sinergicamente, a economia.

O segundo intuito é conciliar tal propósito com a redução dos gastos públicos, ou principalmente, torná-los mais eficientes ou socialmente vantajosos. A abertura de novos concursos, sem comprometer ou ampliar os gastos com pessoal, podem favorecer as demandas por uma melhor qualidade de vida do trabalhador, dando-lhe mais tempo para desenvolver outras atividades pessoais, manter-se qualificado, reduzindo, inclusive, os altos índices de doenças físicas e psicológicas decorrente do trabalho e que ganharam tônus atualmente

No acórdão n.º 1579/16, o Tribunal Pleno do TCEPR, em sede de consulta formal, asseverou a possibilidade de normatização da carga horária diária dos servidores públicos em 6 horas, desde que a medida seja amparada nos princípios constitucionais e no interesse público. Reconheceu ainda como lícita a aplicação de jornada diferenciada a apenas alguns setores do serviço público, eis que não há obrigatoriedade de unicidade de jornada. Recomendou-se, por fim, que essa regulamentação seja feita através de portaria.

Nesse ponto, é oportuno transcrever parte da decisão do Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso emitida nos autos de Consulta n.° 252182/17 apresentada pelo Município de Itiquira:
"A legislação tratando da redução de jornada de trabalho com a respectiva adequação proporcional remuneratória é farta, entretanto, todas destacam a necessidade de haver opção expressa do servidor. Isso porque, a redução de jornada de trabalho com a redução proporcional da remuneração, facultada ao servidor, se traduz em uma verdadeira “compensação” de direitos: o servidor trabalha por menos tempo, mas em compensação, a Administração Pública paga menos pelo respectivo trabalho. 9. Note-se que qualquer alteração no regime jurídico de trabalho do servidor público, ainda que estabelecendo excepcionalidades ou compensando direitos, deve ser realizada por meio de lei em sentido estrito".

Neste sentido, o Acórdão nº 2933/18 do Pleno do TCE-PR assevera que "pode ser instituído em âmbito municipal, mediante Lei, sistema diferenciado de jornada reduzida com a possibilidade de se conferir ao servidor o direito de requerer à Administração Pública o deferimento desse benefício. Todavia, há que se adotar cautelas em relação à eficiente gestão dos serviços públicos, a fim de que não haja prejuízos aos serviços prestados à sociedade, bem como para que não sejam criadas despesas desnecessárias com contratações de novos servidores e remuneração de horas extras em face de eventual precarização de serviços decorrente de ausência de planejamento na instituição do referido sistema".

Isso reduziria as despesas com pessoal, possibilitando a contratação de novos servidores para atender a demanda crescente do município. Daria ainda, aos servidores já efetivos, possibilidade de se aperfeiçoarem na carreira, de realizarem cursos, de manterem a saúde e a qualidade de vida. Sobre isso, sabe-se que muitos servidores se ausentam em virtude de tratamento de saúde, atestados, doenças laborais (como por exemplo, as áreas de educação e saúde, marcadas segundo a literatura da área, por altos índices de afastamentos em decorrência de problemas de saúde e psicossomáticos), as quais poderiam ser evitadas, gerando economia e eficiência ao município, eficiência e economicidade que são princípios constitucionais a serem perseguidos.

É importante destacar ainda, que o Brasil não tem servidores em excesso. Se compararmos o número total de servidores pela população, ficamos atrás da grande maioria dos países. Além disso, o mesmo ocorre na comparação entre os servidores e os demais trabalhadores. Na maioria dos países, o número de servidores é maior.


Não obstante, se vê ultimamente uma série de narrativas que tentam tornar o servidor vilão da história, culpando-o por uma série de problemas inerentes à administração pública e sua gestão política, especialmente decorrentes da falta de investimentos. Basta analisar que em muitas escolas, professores e demais funcionários, para suprimir lacunas deixadas pelo Estado, realizam festas, rifas, eventos, etc. para arrecadar dinheiro e oferecer um serviço de maior qualidade ao cidadão.


Hoje, generaliza-se que o servidor ganha muito. Porém, pega-se casos isolados, do poderes legislativo ou judiciáro. onde tradicionalmente se ganha mais, ou da esfera federal, onde reside os mais altos cargos, e repassa-se para a população a ideia de que todos auferem tais privilégios. Neste discurso, que deve ter a intenção de precarizar e destruir o serviço público, omite-se o alto custo dos políticos e dos tantos cargos comissionados ou apadrinhados políticos que eles indicam.


EXEMPLO DE PROJETO DE LEI Nº [xx/2022]

Redução da Jornada de Trabalho para 6 horas diárias para Servidores Públicos Municipais

Art. 1º Fica instituída a jornada de trabalho de 6 (seis) horas diárias para os servidores públicos municipais, sem prejuízo de seus vencimentos e demais direitos trabalhistas.

Art. 2º A jornada de trabalho prevista no artigo anterior será aplicada a todos os servidores públicos municipais, incluindo aqueles regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho - CLT e pelo Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Municipais.

Art. 3º O horário de trabalho será definido pela Administração Pública, de acordo com as necessidades de cada setor e considerando a possibilidade de rodízio de servidores para garantir a continuidade dos serviços prestados.

Art. 4º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.


Justificativa

A redução da jornada de trabalho para 6 horas diárias é uma medida que visa proporcionar uma melhor qualidade de vida aos servidores públicos municipais, ao mesmo tempo em que gera mais empregos e aumenta a produtividade. Além disso, pode servir de estímulo para medidas semelhantes na iniciativa privada, estendendo seus benefícios a toda sociedade.

Com a redução da jornada de trabalho, os servidores terão mais tempo para cuidar da saúde, da família, para estudar e se qualificar para o exercício do cargo o que pode gerar benefícios tanto para os próprios servidores quanto para a sociedade como um todo.

Além disso, a medida pode contribuir para a criação de novos empregos, uma vez que a redução da jornada de trabalho pode aumentar a demanda por mão de obra, especialmente em setores como saúde, educação e segurança pública., proporcionando margem para abertura de novos concursos ou  excepcionalmente de novas formas de contratação.

Por fim, a proposta também é uma forma de valorizar os servidores públicos municipais, reconhecendo o papel fundamental que desempenham na prestação de serviços essenciais à população, bem como de se adequar aos novos tempos onde a eficiência e a produtividade, bem com a qualidade de vida, se sobrepõe a carga de trabalho baseada e controlada simplesmente pelo volume de horas.

Diante do exposto, conto com o apoio dos nobres colegas para a aprovação deste projeto de lei.

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