Antigamente era assim !

Não sei se podemos afirmar que as coisas atualmente estão melhores que no passado. É uma questão de opinião, de história individual, de percepção. Mas podemos, com toda certeza, afirmar que as coisas mudaram muito, especialmente nas duas ou três últimas décadas. Podemos confirmar esta premissa valendo-se de exemplos da tecnologia, da medicina, da indústria, mas sobretudo, com exemplos das relações sociais.

Já escrevi um texto neste blog falando das brincadeiras da década de 1980, 1990. O contexto social, econômico, cultural, etc. permitia que as crianças realizassem certas atividades. Havia espaço, condições ambientais, tempo, segurança, mas principalmente, menos alternativas mais atrativas, como vídeo-games, smartphones, etc.

Hoje gostaria de trazer à tona exemplos da vida cotidiana, mais especificamente, das atividades domésticas.

As pessoas, no frenesi da vida moderna, lamentam-se da falta de tempo. Da dificuldade na realização das atividades diárias: demanda de tempo, dispêndio de esforços, ideologia de gênero, etc.  Mas vejamos como nossas mães e avós realizavam, em regra, algumas atribuições.

O fito não é apenas trazer um ar de nostalgia, mas uma reflexão sobre o valor positivo ou negativo de certas mudanças que vão ocorrendo

e que levado ao fogo, o aumento gradual do calor o faz cozinhar sem perceber.

Atualmente, ao levantar, acendemos a chama do fogão a gás e fazemos um café, com pão comprado na panificadora da esquina. Isso quando não utilizamos cafeteiras elétricas, o micro-ondas ou desembalamos algum alimento industrializado facilmente acessível e com custo relativamente barato ou quando trocamos o café  por um suco (ou água colorida com açúcar) de caixinha. 

https://pt.depositphotos.com/stock-
photos/lenha.html

Naqueles tempos, nossos pais compravam uma “carroçada”de lenha, deixavam secar, cortavam a machado, guardavam no antigo caixão de lenha, para de manhã cedinho, se acendesse o fogo no fogão de lenha, esperasse aquecer a chapa, a água, para só então fazer o café.

O pão era caseiro.  Assado no forno de lenha,  construído geralmente por algum membro da família, que após construir realizava um verdadeiro ritual de “cura” para ficar no ponto de uso.  

No dia de efetivamente assar os pães (amassados a mão, crescidos no calor do sol, etc.), fazia-se o fogo, esperava-se a formação das brasas, depois elas eram varridas com vassoura (artesanal) para então inserir as formas de pão (muitas formas eram feitas artesanalmente a partir de latas de óleo de soja).

Veja mais em: 
http://www.superlinda.
com/2015/05/pao-de-casa-
no-forno-lenha.html

Com o pão pronto, ao consumi-lo, a Nuttela da época era banha de porco, criado, engordado e morto nas propriedades rurais. Ou usava-se geléia, doce de leite, de abóbora ou outros adicionais caseiros.

Enfim, um simples café da manhã elaborado hoje em 5 minutos, outrora demandava horas de trabalho coletivo, de preparação e planejamento. Enquanto o pão não ficava pronto, para saciar a fome da família era praxe comer os bolinhos fritos.

A limpeza da casa passava pelo ato de encerar o chão de madeira, ao menos semanalmente. Ajoelhava-se no chão, e com um pano, aplicava-se a cera. Depois se  lustrava para tirar as manchas à base de escovão e palha de aço, cuidando para não bater nos móveis !

Fonte: www.bemparana.com.br

Não havia pisos cerâmicos que são facilmente limpos com um pano úmido em uma miríade de produtos de limpeza para n finalidades específicas (desinfetante para a tampa da pia do banheiro).

Outra tarefa árdua era lavar a roupa. Primeiramente, porque as famílias eram maiores. Logo, mais peças iam para o varal. Também porque o tipo de trabalho e afazeres da época colocava as pessoas em maior grau de atividade (suor) e em maior contato com a terra (sujeiras).  Por óbvio,  não havia a popularização da máquina de lavar. Não havia sequer a popularização da água encanada.

Comecemos do início: as famílias usavam técnicas de prospecção para encontrar vertentes de água e abrir poços. A água era utilizada para o consumo e para as atividades do dia a dia. Assim, para lavar a roupa, a dona de casa tinha que se dirigir ao poço, tirar vários baldes de água, levar ao tanque e enchê-lo. 

As roupas,  eram esfregadas a mão ou em esfregadeiras de madeira. Utilizava-se anil para branquear, utilizava-se o quaral (um estrutura armada para a roupa tomar sol ensaboada e facilitar a limpeza), depois era posta para secar e por fim passada com o velho ferro à brasa.

Hoje, literalmente se joga a roupa na máquina e se retira praticamente pronta para o uso. Isso sem contar que há serviços de lavanderia bem mais acessíveis para aqueles que não dispõe de tempo ou de espaço para o trabalho nos apartamentos cada vez menores.

Ao ilustrar estes poucos exemplo do cotidiano de algumas décadas atrás, este texto busca mais do que ser nostálgico, mas chamar o leitor para uma reflexão sobre as mudanças (evolução ou involução) que ocorreram de forma tão rápida e drástica na vida das pessoas, nas relações familiares e nas relações sociais, e como consequência, na economia, na cultura, etc.

www.conceitozen.com.br
Se por um lado, o acesso às novas tecnologias liberou as pessoas do trabalho diário mais exigente, árduo e demorado, por outro lado, o fez para que estes tivessem mais tempo para trabalhar, auferir renda e comprar estas comodidades.  

   Ou seja, as comodidades que nos livram do trabalho nos impõem mais trabalho para adquiri-las. E muitas não têm valor apenas pela sua utilidade, mas pelo status que geram, pela sensação de inserção e pertencimento aos novos paradigmas sociais. Algumas necessidades atuais sequer existiam, pois justamente foram criadas pelo tal mercado e se tornaram novas imposições.

Será que o tempo liberado por estas modernidades foi aproveitado para convivermos mais com a família, termos mais contato com os filhos, pais, amigos, praticarmos alguma atividade física e cuidar da saúde, da alimentação, ou dispormos de um momento de descanso reparador ?

Há um paradoxo. Cada vez mais temos menos tempo (ou mais coisas para se fazer com o tempo  que temos). As famílias são menores. Filhos ficam em creches ou escolas em tempo integral para os pais trabalharem suas 8, 10, 12 horas diárias. As pessoas passam o dia sentadas em frente a um computador, a uma máquina ou em um veículo. Após um dia totalmente inerte, algumas ainda conseguem 30 minutos para uma caminhada (onde se gasta mais 30 para se calçar o tênis da moda e os demais acessórios fitness), dando a falsa impressão de que não são sedentários. Outras sequer tem este tempo.

E neste estilo, investimos tempo e esforço no trabalho, focados em ampliar a renda e consumir mais. Deixamos de lado família, amigos, a nossa saúde física e mental.  Para vencer a correria, somos  impulsionados a nos focarmos ainda mais no trabalho, para obter mais renda e consumir mais para atender às novas necessidades, entrando em um círculo vicioso.

Como consequência perdemos a saúde, a qualidade de vida, e temos que trabalhar ainda mais para comprar medicamentos que aliviam os sintomas das diversas doenças que conquistamos. Temos que investir tempo e dinheiro para superar as restrições alimentares porque ficamos anos nos alimentando mal por falta de tempo; temos que achar tempo para fazer alguma atividade física para retardar as doenças decorrentes do estilo de vida (vide epidemia de diabetes e de depressão).

Ou seja, nos sacrificamos para no final fazermos exatamente aquilo que os “antigos” faziam como parte natural da vida. E hoje vemos o mercado nos apresentar de forma gourmet coisas que nossos avós já faziam em sua simplicidade

Vemos um retorno à normalidade do passado, mas que agora está acessível a poucos.  Um passado que virou mercadoriaHoje vemos muitos, especialmente quem dispõe de certo espaço na área urbana reviver algumas práticas antigas. Plantar uma horta, contato com a terra, alimentos sem agrotóxicos, comida caseira, atividade física, banha de porco...o que antes era normal hoje é luxo!

Mas se usarmos bem nosso tempo, se dormirmos umas duas horas a menos, se trabalharmos muito, talvez consigamos ser mais produtivos e eficientes, ter uma renda melhor, adquirir as facilidades modernas e viver bem, e quem sabe um dia, teremos tempo para a recuperar a família, os amigos, a saúde...se tivermos dinheiro, e tempo !

Parafraseando Lair Ribeiro: Se você não arrumar tempo e recursos para cuidar de sua saúde hoje, um dia terá que arrumar tempo e muito mais dinheiro para cuidar de sua doença...

Nenhum comentário:

Postar um comentário