A terceirização como politica de desmonte da Educação e do Estado Social

Fonte: APP Sindicato
A Educação Pública vem sofrendo ataques ideológicos há tempos, tendo como principal argumento a busca pela qualidade e eficiência.

Neste contexto, a Educação e seus trabalhadores (bem como servidores públicos em geral) são responsabilizados pelo excesso de gastos com pessoal. Além disso, muitos atribuem a eles a culpa pelas deficiências pedagógicas dos alunos.

Ignora-se assim, que o aprendizado é uma questão complexa. Que não basta a

boa vontade do professor, mas é necessário recursos (materiais, tecnológicos, formação, investimentos...)e know-how  em todo sistema educacional, além de investimentos em políticas públicas eficientes na área social e econômica e as condições para participação das famílias no processo.

Alunos oriundos de famílias com melhores condições socioeconômicas, inegavelmente terão maiores facilidades de obterem bons resultados. Logo, o acesso à Educação ao mesmo tempo que reduz a desigualdade, depende desta redução para ser mola propulsora de desenvolvimento social e econômico. Enfim, a Educação está inserida em um contexto social, político, econômico, demográfico, cultural que lhe afeta e que é afetado por ela.

Com relação aos gastos com pessoal, ignora-se que embora os professores sejam uma categoria ampla, os salários, em geral, são menores que os de outras profissões de nível superior. Soma-se ainda que no famigerado gasto com pessoal, criticado e repercutido pela mídia, estão inclusos cargos do alto escalão, indicados politicamente. Destaca-se que no Brasil, a classe política eleita representa um verdadeiro exército de pessoas (segundo colunista Ana Maria Dalsasso, em torno de 70 mil), fora seus auxiliares, com salários, benefícios, recursos e uma boa estrutura a seu dispor.

Entre os ataques que a Educação vem sofrendo, está o chamado desmonte, lento, porém gradual. Professores concursados que se aposentam ou se afastam são substituídos em grande parte por contratados, os quais, sendo temporários, não têm uma relação de continuidade que permite o aperfeiçoamento e o desenvolvimento na carreira, nem o sentimento de pertencimento à classe. Não há, assim, um projeto de longo prazo para a Educação. Segundo a APP Sindicato, de cada 10 professores, 4 são contratados.

Diversos estudos apontam para os aspectos negativos da composição de quadros docentes com profissionais temporários, entre eles, a falta de formação específica na área, impactos sobre as condições de trabalho, o que se reflete até mesmo nos aspectos físicos e psicológicos. Segundo a revista Nova Escola, ainda em 2018, quase 70% dos professores já precisaram se afastar por problemas de saúde.

Reforçando as bases ideológicas para o desmonte da Educação, recentemente, adotou-se o discurso da Educação Domiciliar, a qual recebeu inúmeras críticas que não caberia discorrer aqui, entre elas, a de partir do pressuposto de que todas as famílias têm condições materiais e pedagógicas de repassar os conteúdos, além de que estariam privando do convívio e das interações sociais as crianças justamente na idade onde há o maior desenvolvimento intelectual, motor, psicossocial, etc.

Inclusive, em um discurso absurdo e enviesado, acusam as escolas de doutrinação, justamente pelo fato delas serem um lugar aberto aos conhecimentos e ideias, contrário aos preconceitos e discriminações, de convívio com o diferente, onde as visões distorcidas, preconceituosas e restritas são mitigadas.

Em muitas áreas, adota-se uma estratégia sutil, mas ardilosa de convencimento e de cristalização de uma imagem inverídica, distorcida, que atende a determinados segmentos ou nichos, sobretudo poderosos econômica e politicamente.

De início, ataca-se algo relativamente inofensivo. Algo que passa pelo crivo crítico da sociedade sem despertar a atenção. Com isso, gera-se aceitação e se naturaliza esta realidade ou ideologia. Na sequência, avança-se mais um degrau, ganhando terreno perante a opinião pública. E por fim, dão o golpe final, enquanto a sociedade, inerte, assiste a perda de direitos e a deterioração das condições socioeconômicas, trabalhistas, enfim, a perda de direitos históricos básicos e a própria a noção de classe social.

É analogamente semelhante à fábula do sapo mergulhado na água. Se ele cair na água quente, ele sente a pele queimando e rapidamente salta para fora. Porém, se ele for mergulhado em uma água que gradualmente vai se aquecendo, ele morre sem se dar conta.

No Paraná, por exemplo, na esteira das políticas (neo)liberais, privatistas e entreguistas, que favorecem a barganha politiqueira de cargos e o apoio de setores econômicos, o Governo Estadual dando continuidade à sanha de experiências privatistas, lança o edital para um projeto piloto que visa entregar 27 colégios públicos para a iniciativa privada.

De início, serão entregues apenas os colégios que auferiram baixo IDEB (como se isso fosse resultado ou culpa exclusiva dos colégios e não fracasso das políticas públicas como um todo, inclusive, é bom salientar que muitos dos colégios com baixo IDEB provavelmente atendem alunos de áreas periféricas, população pobre, com IDH menor e maior desigualdade,  enfrentam falta de recursos, deficiência nos quadros funcionais, etc.).

Isso abre as portas para que futuramente mais escolas e colégios sejam negociados. Como se trata de uma política travestida com ares de modernidade e eficiência, a tendência é que sem o repúdio social, outros entes tendam a adotar medidas semelhantes.

Ocorre que a troca de concursados por contratados, a terceirização ou entrega a dos colégios não é garantia de economia para os cofres públicos. Embora profissionais contratados possam ganhar salários menores (se acompanhar o salário inicial dos professores e principalmente dos demais profissionais que já são relativamente baixos), haverá custos operacionais, encargos trabalhistas, e a parcela de lucro da empresa contratante, que com certeza, terá  boa fatia de lucros. Ou seja, trata-se de um negócio para gerar lucro para a iniciativa privada. Até porque o edital prevê que não haverá redução nos investimentos estatais.


Também é preciso ressaltar que a escola pública é composta de diversas instâncias que garantem a gestão democrática e a participação nas decisões, na fiscalização e no controle pelos diversos segmentos sociais, especialmente ligados à comunidade escolar, o que muito provavelmente se perderá com uma gestão privada das entidades.

Fonte Sindservguaira
Destaca-se ainda que nestas condições, possivelmente serão atraídos para as escolas profissionais com menor experiência e qualificação.  E mesmo que assim não fosse, a função do Estado ao investir na Educação Pública, assim como na Saúde, e em outras áreas essenciais, não é obter lucros ou buscar a eficiência de mercado. O retorno do investimento estatal está na geração de valor para a sociedade.

Ao dar Educação Pública se está formando a massa de cidadãos críticos, a força de trabalho, os cérebros que irão desenvolver tecnologias, inovações, fazer ciência...E com isso, toda sociedade, inclusive os setores econômicos, lucram com este contexto de desenvolvimento.

E percebam que a janela do discurso (Janela de Overton) vai se ampliando. Iniciou-se defendendo a privatização, terceirização e entrega de atividades meio, não essenciais. Agora, a sociedade aceita como natural o ataque em áreas essenciais, como Educação e Saúde.

O que estamos vendo é a destruição da função social do Estado, mais especificamente, das políticas públicas voltadas para atender o social, como a Educação e a Saúde. A sociedade vê os direitos registrados na CF/88, que custaram décadas de reinvindicação e lutas, serem relativizados e solapados. Os trabalhadores, em nome de uma suposta flexibilização, perdem direitos, beneficiando apenas o capital, enquanto são cada vez mais precarizados, enquanto a estrutura estatal serve de arranjo para acordos politiqueiros e barganhas com setores econômicos que tendem a lucrar, colocando o argumento da eficiência por água abaixo.

           Na verdade, cada vez mais, fica nítido que o Estado em vez de ser uma construção e uma estrutura social e política voltada para atender ao povo, é usado para ser instrumento de poder político e econômico em benefício de grupos que tentam se perpetuar no poder

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